28 de abr. de 2007

Vida que segue

Bem, acho que tenho muitos blogues inativos. Além do 'Doces Pensantes', tenho o 'Livro de Sombras' e o 'Processo de Criação', não contando o de atualizações (hahahaha) do 'Canto de Luar', a minha fracassada tentativa de um blog pessoal secreto e o da 'Fábrica dos Sonhos', que em breve irá dar lugar a uma surpresa.

Então, farei uma coisa. Eu vou deixar só esse e o em que eu coloco as atualizaçãos (hahahaha) do 'Canto de Luar'. Vou deletar os demais, mas vou salvar as postagens. Irei reler todas e aos poucos irei republicar por aqui. Enfim, who cares anyway? Ninguém lê isso mesmo.:)

Combinado? Ok.

***

Detesto sábados chuvosos em que eu tenha que sair de casa por obrigação. Gosto de colocar o nariz na rua por gosto, principalmente em um dia dedicado ao ócio. Sim, porque como sou uma pessoa eclética, aproveito o melhor de cada religião. O meu sábado é judeu, não faço nada de útil à humanidade.

Porém, hoje o dever chamou. E ao invés de aproveitar o friozinho em casa, lendo, vendo filme, jogando, chateando meu filho (o que é muito legal de fazer, agora entendo porque minha mãe gosta tanto disso), fui até a Tijuca para o chá de bebê de duas pessoas lindas, que eu adoro muito. Só gostando muito para tirar a eremita rabugenta de casa hoje.

Já tinha comprado um pacote de fraldas, mas achei pouco. Passei em uma farmácia aqui perto de casa, antes de pegar o ônibus, comprei mais um pacote das noturnas e umas miudezas importantes (acreditem, mães de primeira viagem sempre esquecem as miudezas). Na caixa, quando eu coloquei as minhas aquisições no balcão, uma senhora - daquele tipo de dona velha que se acha muito nova, descolada e blábláblá - vira pra mim e diz: 'Ah, é tão bom fazer enxoval. É o primeiro filho?'

Obviamente, eu rosnei ameaçadoramente, respondendo: 'Não é pra mim. Não estou grávida. Cuide da sua vida.'

Pessoas: não comentem a vida alheia. Principalmente se a alheia estiver presente e de mau humor. Aliás, essa questão de gravidez é um bocado delicada. Mesmo se você conhecer a pessoa, muito cuidado ao fazer comentários como 'Ah, você tá grávida'. A moça pode só ter engordado. E não estar nada feliz com isso. O melhor jeito é 'Nossa, você tá diferente...'; se ela estiver grávida, vai contar. Se for quilos a mais e ela estiver bem resolvida quanto a isso (acreditem, alguém deve ficar bem resolvida nesse quesito, I hope), a pessoa irá dizer. Se ela estiver obviamente mais gorda e disser 'Cortei o cabelo', MUDE DE ASSUNTO. E evite rosnadas. Ou mordidas.

O convescote (atchim, que palavra empoeirada) estava animado e tal. Voltei para casa satisfeita duplamente. Por ter ido e por saber que em meia hora estaria a caminho do meu lar. No metrô, senta-se na minha frente uma menina, deve ter seus vinte anos. Tão bonitinha, branquinha, de calça jeans, blusa preta de alcinha, cabelos muito negros presos atrás... Sabe a Morte do Sandman? Bem parecida, até o jeito.

Gostei. Porque estou rascunhando um romance passado nos nossos dias e no nosso mundo (ao contrário de quase tudo que escrevo) mas não tinha achado a cara da personagem. E decidi. Seria ela. Ah, queria saber desenhar, pois teria sacado do meu bloco e desenhado a moça ali mesmo. Ela parecia tão feliz, tão satisfeita consigo mesma.

Ainda não decidi sequer o nome da personagem, apenas sei que ela será alguém com força para enfrentar situações muito adversas e extremamente apaixonada por tudo. Se não fosse o medo da guria me achar louca, teria perguntado o nome dela.

Mas fiquei olhando sem encarar, tentando pegar os pequenos detalhes da menina. O jeito de sentar, arrumar o cabelo, olhar para as pessoas. No Estácio, aconteceu algo que nos tornou cúmplices.

Entrou uma mulher jovem ainda, nos seus vinte anos. Reparem, eu antes falava de uma menina dessa idade. Agora é uma mulher. Aliás, fêmea mesmo. Com mais carne exposta que coberta, apesar da temperatura agradável de outono. Costas nuas, micro short, unhas ferozmente feitas (sério, garras me dariam menos medo), salto de oncinha altíssimo, cabelo louco esticado e maquiagem carregada, um namorado com cara de bobo a tiracolo.

O vagão do metrô parou para olhá-la. Os homens com aquela cara de idiotas que ficam sempre que uma mulher medianamente atraente aparece mais despida do que vestida. E quase todas as mulheres com inveja por ser jovem e bonita.

Duas não pareciam olhar assim. Tanto eu como a menina que irá se tornar a minha protagonista olhavamos a fêmea exposta, mas não com inveja. Podia ver nos olhos dela a mesma indagação: como seria ser assim, tão bonita e tão confiante de si mesma?

A minha grande vontade - daquelas que chegam e sabemos que irão se esvair sem se concretizar - foi de pegar nas mãos dela, da menina de cabelos pretos presos, e dizer que ela era imensamente mais bonita. E que seria inspiração para alguém.

A menina me olhou nesse minuto em que a vontade bateu com força. Ela sorriu de canto, no momento em que o alto-falante anunciou a minha estação.

Ao descer do metrô, fiquei com pena de não ter dito a ela o que quis.

Menina, se você ler isso um dia e souber que foi você: é maior do que isso, você é tão mais bonita...

E minha protagonista, no caminho para Niterói, ganhou um nome que se juntou ao rosto juvenil que vi: Marcela.

Porque?

Eu gostei, oras. E a menina tem cara de Marcela.

ArturiANA alternativa


Depois de anos martelando o poema de Tennyson na cabeça, os textos do Octa e do Lupo no Hyperfan conseguiram me dar uma brecha e libertar a Dama de Shalott.


Tennyson adorava as histórias da corte de Arthur, mas lhes dava um tom melancólico, bem 'mal do século'. No poema da mulher criada em total isolamento não foi diferente e eu quis manter isso.


Conheci o poema, por incrível que pareça, em uma epígrafe de um livro da Agatha Christie, 'A maldição do espelho'. Ele também é citado recorrentemente no romance. Fiquei com ele na cabeça por um tempo.


Depois, vieram as lindas pinturas de Waterhouse. A que ilustra esse post é a minha predileta.
E por fim, Loreena MacKeenit musicou um trecho bem extenso do poema de Tennyson. Não pude mais resistir.
É só clicarem no título do post para irem ao site do Hyperfan. Espero que gostem.

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Vendo máquina de escrever enferrujada, gasta, carcomida, sem nenhum valor.

Exceto o de ter sido o lugar em que primeiro gastei meus dedos tentando dar um ar profissional ao meu pobre sonho de escritora. Sim, eu, como boa filha do século XX passei pela fase do manuscrito, enchendo cadernos com uma letra sofrível. E depois, alvissareira (palavra, como a minha máquina, carcomida e enferrujada), comprei a minha pobre Olivetti.

Prendi os dedos nas teclas, quebrei unhas tentando colocar maiúsculas, risquei esmaltes desembolando fitas. O futuro chegou e a larguei de lado, com a chegada do meu primeiro computador pessoal. Ah, a glória de cortar e colar, corrigir sem aquela pavorosa tinta branca, não mais ter que descartar páginas por meros erros...
E a internet, ligação com o mundo, livros ao meu dispor, pessoas para conhecer! Tudo em minhas mãos, ao apertar de umas poucas teclas. Resultados? Infelizmente, ser escritora é ainda apenas sonho.

Então, resolvi livrar-me do passado. É por isso que vendo máquina de escrever. Enferrujada, gasta, carcomida.

Assim como eu.

27 de abr. de 2007

Fim da dor

Anos passaram sem que Antônio voltasse do mar sem fim. Maria de Fátima, envolta em tecidos negros, chorava seu luto olhando o azul interminável até doer a vista.

Na tempestade que arrasara tantos navios, apenas Antônio jamais fora encontrado. Nem seu corpo.

Por isso, olhava o mar, fio de esperança que corria em sua alma.

Quando viu a silhueta tão conhecida erguer-se na água, sorriu. Não reparou que a pele pendia, que as órbitas eram buracos vazios, que os cabelos eram algas amareladas.

Enquanto corria para abraçá-lo, mesmo sentindo o fedor da podridão, só pensava em como era bom tê-lo de volta.